por Chloé Pinheiro, Dalena Theron e Theo Ruprecht | design
Laura Salaberry
"Ficar sem se movimentar é um
enorme risco. A cama mata", afirma Rui Curi, diretor do Instituto de
Ciências Biomédicas (ICB), da Universidade de São Paulo. A frase é forte, mas
não sem motivo - basta olhar a lista da Organização Mundial da Saúde (OMS) de
problemas que mais enumeram vítimas para compreender sua seriedade. Isso porque
no top 10 desse ranking encontram-se nada menos do que sete quadros possíveis
de serem prevenidos ou ao menos controlados por meio da atividade física (veja
abaixo). Mesmo assim, só 30% dos médicos americanos receitam movimentação
constante em situações em que ela seria definitivamente benéfica. "O
panorama no Brasil é semelhante", lamenta Renato Nachbar, educador físico
do ICB.
Até por isso, a revista científica The Journal of Physiologypublicou um
comentário sobre a hipótese de o sedentarismo ser, por si só, encarado como uma
doença. "O bom é que ele tem cura: doses regulares de exercício físico dão
conta do recado", comenta Michael Joyner, anestesiologista da Clínica
Mayo, nos Estados Unidos, e autor do artigo. "Se recomendarmos mais desse
medicamento natural, prescreveremos menos drogas para contornar vários
transtornos, além de melhorar a qualidade de vida das pessoas", arremata.
Em 2011, o governo federal criou o Programa Academia da Saúde, que visa
construir 4 mil polos para a prática de exercícios até 2014, além de já ter
incorporado centros similares em vários estados. "Doentes crônicos que vão
a esses locais podem diminuir a quantidade de medicamentos tomados",
ressalta Alexandre Padilha, ministro da Saúde. Nas academias do Rio de Janeiro,
83% dos frequentadores passaram a ingerir menos remédios e 7% nem precisaram
mais deles.
Já na iniciativa privada, a Companhia Athletica firmou uma parceria com o
Hospital Samaritano, na capital paulista. A partir dela, indivíduos tratados
nesse hospital com uma enfermidade em que suar a camisa acarrete benefícios
ganham descontos e avaliações físicas e nutricionais nas unidades da rede de
academias. "O médico recomenda especificidades para o educador físico e
acompanha a evolução do paciente a todo momento", informa Patrícia Lobato,
consultora da Companhia Athletica. "Parcerias assim oferecem um treino
supervisionado e direcionado às limitações de cada um", completa Roberto
Cury, cardiologista do Hospital Samaritano.
Se o exercício é remédio, dosá-lo é primordial. Confira a seguir seus efeitos
nas mais temidas doenças do mundo e saiba o que importa, em cada caso, para que
ele seja um medicamento, e não um veneno.
As principais causas de morte
|
Motivo
|
Milhões de mortes/ano
|
1
|
Infarto *
|
7,25
|
2
|
AVC *
|
6,15
|
3
|
Infecções pulmonares *
|
3,46
|
4
|
DPOC *
|
3,28
|
5
|
Diarreia
|
2,46
|
6
|
Aids *
|
1,78
|
7
|
Câncer do trato respiratório *
|
1,39
|
8
|
Tuberculose
|
1,34
|
9
|
Diabete *
|
1,26
|
10
|
Acidentes de carro *
|
1,21
|
Fazer um esporte ajuda a tratar
os problemas marcados com asterisco nesta lista perigosa.
Fatores de risco que mais matam
1 Alta pressão arterial *
2 Tabagismo *
3 Hiperglicemia *
4 Inatividade física *
5 Sobrepeso e obesidade *
6 Altos índices de colesterol *
7 Sexo inseguro
8 Consumo de álcool *
9 Subnutrição infantil
10 Inalação interna de combustíveis sólidos
O sedentarismo está em quarto lugar no ranking da OMS. Mas, se pensar bem, ele
contra-ataca todos os itens com asterisco.
1º causador de mortes: Infarto
Tanto é fundamental se mexer para escapar do líder do ranking da OMS que o
Instituto do Coração (InCor), em São Paulo, tem uma ala especialmente dedicada
a deixar em forma indivíduos que já passaram por panes no peito. "Após o
infarto, trabalhamos para recuperar a função cardíaca o mais rapidamente possível.
Logo depois, iniciamos treinos que evitem novos eventos desse tipo",
explica a cardiologista Patricia Oliveira, da Unidade de Reabilitação
Cardiovascular e Fisiologia do Exercício da instituição. No coração, a
atividade física age em duas frentes. Primeiro, promove uma verdadeira faxina
nas artérias, retirando de cena o LDL, aquele tipo de colesterol que financia a
formação de placas nos vasos. Esses acúmulos gordurosos, se não domados,
crescem até impedir totalmente o sangue de circular por lá. Ao mesmo tempo, a
malhação colabora para manter as artérias jovens por um bom tempo (veja nos infográficos abaixo).
Recomendações Realizar atividades aeróbicas,
como caminhada e ciclismo, cinco vezes na semana. E respeitar os sinais de
cansaço.
2º maior causador de mortes: AVC
Garantir artérias saudáveis com a ajuda da esteira ou da bicicleta não
resguarda só o músculo cardíaco. Afinal, se um dos canos que irriga a massa
cinzenta perde sua flexibilidade ou fica tapado por uma placa de gordura -
consequências típicas do sedentarismo -, certos neurônios não recebem os
nutrientes vindos do sangue. É o começo de um derrame. Então, começam a
definhar. "A atividade física ainda promove uma vascularização cerebral,
proporcionando novos vasinhos na região, o que incrementa o abastecimento
sanguíneo", destaca Ricardo Arida, neurofisiologista da Universidade
Federal de São Paulo. E mesmo quem já sofreu com essa pane pode ao menos
atenuar seus impactos no dia a dia se não ficar parado. "Em trabalhos
recentes, observamos que o exercício, em animais, forma uma maior quantidade de
células nervosas", revela Arida. Em certas situações, isso ajudaria na
recuperação da coordenação ou mesmo na da cognição.
Recomendações Modalidades
aeróbicas auxiliam a prevenir a encrenca. Se exigirem reflexos e decisões
rápidas, melhor ainda!
3º maior causador de mortes: Infecções pulmonares
Uma parcela dos falecimentos por pneumonia acontece sem a chance de um
tratamento. Porém, essa doença também vitima gente bem tratada e... acamada.
"Sem movimentação, há um acúmulo de secreções no pulmão, um banquete para
bactérias", diz o pneumologista Elie Fiss, da Faculdade de Medicina do
ABC, na Grande São Paulo. Logo, em qualquer doença, a pessoa deveria tentar se
mexer. Os exercícios ainda deixam nossas defesas mais eficazes. "Mas, em
excesso, abalam a imunidade, fazendo surgirem infecções", avisa Tânia
Curi, educadora física da Universidade Cruzeiro do Sul.
Recomendações Mover-se
cinco vezes na semana. Evitar ambientes secos ou frios e não se esquecer da
musculação.
4º maior causador de mortes: DPOC
Recomendações Fazer
exercícios aeróbicos e de resistência ao menos duas vezes na semana, por meia
hora apenas.
6º maior causador de mortes: Aids
"Em 1996, houve uma revolução nos medicamentos contra o HIV. Hoje, o
principal risco para o soropositivo não são as infecções, mas sim as doenças
cardiovasculares", estabelece Alex Antonio Florindo, educador físico da
Universidade de São Paulo. Entre essas novas drogas figuram os inibidores de
protease. "Essa classe de remédios, embora importante para barrar o vírus,
interfere no metabolismo, elevando as taxas de colesterol e gordura e,
portanto, a ameaça de um infarto", explica o pesquisador Luís Fernando
Deresz, da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, no Rio
Grande do Sul. E nem precisamos falar da capacidade dos exercícios de baixar
esses índices.
Recomendações Os
efeitos benéficos são mais observados se a atividade for regular - meia hora
por dia, por exemplo. Deve-se ficar de olho na carga viral e no coração.
7º maior causador de mortes: Câncer do trato
respiratório
"Ainda não há estudos que atestem o exercício como forma direta de
prevenção a esse tumor", opina o pneumologista Gustavo Prado, do Instituto
do Câncer do Estado de São Paulo. Mas, assim como em todos os tipos de câncer,
o esporte é um aliado no tratamento, já que combate quatro complicações da doença:
dor, fadiga, depressão e distúrbios do sono.
Recomendações Focar na
flexibilidade e no treino de força para se blindar contra sintomas desse
câncer.
9º maior causador de mortes: Diabete
Para entender a importância de suar a camisa entre os diabéticos, um grupo da
escola de Ciências da Atividade Física, da Universidade de São Paulo, estudou o
efeito do esporte em ratos com uma dieta cheia de açúcar. "O grupo de
animais que comeu dessa maneira sem treinamento físico ficou diabético em seis
semanas", relata a cientista Fabiana Sant’anna evangelista, autora do
experimento. "Já os que se exercitaram, mesmo comendo mal, não
desenvolveram a doença", completa. Os mecanismos por trás dessa benesse
não estão totalmente desvendados, mas já há pistas. "O treino impede que o
tecido adiposo cresça, freando processos inflamatórios que interferem no
trabalho da insulina", aponta a pesquisadora. A resistência a esse
hormônio é uma das principais chateações na vida de quem luta contra o diabete
tipo 2.
Recomendações Os
medicamentos devem ser dosados conforme o exercício. Consulte o médico.